sábado, 7 de abril de 2012

EU E A ESQUERDA.

Fui educado em escola militar (Colégio da Polícia Militar) nos anos 70 dos meus 12 aos 18 anos, sujeito ao caldo de cultura típico de orientação de direita ultra reacionária, com uma intensa propaganda anticomunista por parte da maior parte dos professores militares. Entre os professores civis, tinha um que era político de Olinda, membro do partido aliado da ditadura a ARENA. Na eleição de 1978, eu e alguns colegas já éramos eleitores, Jarbas Vasconcelos naqueles tempos fazia parte do campo da esquerda enfrentava dois candidatos do outro lado, eu e alguns colegas éramos seus eleitores, não me perguntem por que isso, que eu mesmo não sabia porque votava nele. Entre as pessoas que eu mais prezava, alguns eram irmãos mais velhos do meu melhor amigo, junto deles andavam pessoas que eram opositoras do regime militar, gente do movimento estudantil, um deles ultra esquerdista que até atentado sofrera dentro das instalações da UNICAP. Panfletários e arrochados demais viviam nos doutrinando acerca dos malefícios do regime dos generais, ouvi tanta ladainha dessa gente que terminei sendo catequizado, mas sem me envolver com militância.

Era proibido no colégio fazer proselitismo político por orientação do nosso comandante, um coronel PM liberal, que não via com bons olhos esse tipo de coisa. No colégio, lembro de um dia em que esse professorzinho de História do Brasil, um fascista, veio nos orientar a votar na ARENA pois o MDB era um partido de bandidos e cabras safados. Um colega nosso da cidade de Bezerros, cujo pai era político, justamente do PMDB, levantou aloprado dizendo: cabra safado e bandido é você, meu pai é um homem de bem seu filho da puta. Dizendo isso e partindo pra cima do cabra que cagou fino, chegou o direitista até chamar o sargento monitor para a sala, sendo o colega levado para justificar sua indisciplina diante do oficial que cuidava dessa parte. Em condições normais, o colega pegaria uma punição disciplinar, mas, em vista de que o professor também cometera um erro ainda mais grave, ficou o dito pelo não dito.

Minha admiração pela União Soviética vinha do fato de ser eu jogador de xadrez, os campeões mundiais da era áurea do xadrez eram soviéticos, era que se consolidou em 1948 com a vitória do meu ídolo Mikhail Botvinik, seguido de Vassily Smislov, Tigran Petrossian, Mikhail Thal, Boris Spasky. Meus livros de xadrez, a maior parte em espanhol, tinham muitas citações às virtudes do regime de “socialismo real” vivenciado pela “pátria do socialismo”. Por influência dos meus amigos vermelhos lá da Vila do IPSEP, comecei a ler O Pasquim, assim como os jornais clandestinos da imprensa nanica da esquerda.

Em 1979, fui convocado para servir o Exército Brasileiro, justamente no CPOR do Recife, muito a contragosto, mas, já que estava lá, dei um jeito de cumprir as obrigações de cidadão sem grandes turbulências, tanto que conclui meu serviço militar sem nenhuma punição disciplinar e classificado com segundo lugar da minha turma de aspirantes a oficial R2 da Arma de Engenharia. Foi um suplício, além da total falta de vocação para a vida da caserna, ter que agüentar por um ano e mais quarenta e cinco dias de estágio num batalhão em Natal a cantilena fascista dos meus instrutores e comandantes. Uns mais, outros menos, mas era um choque cultural enorme, ter tido dos meus 17 aos 19 anos uma vivência livresca que me fez pensar à esquerda e ser um opositor da ditadura militar, ter ouvir aquela doutrinação toda e ver colegas entrarem na onda dos milicos era cruel demais.

Em 1980, na UFPE cursando Matemática, caí intensamente nas leituras de Eduardo Galeano(As veias abertas da América Latina), Leo Hubberman (A história da riqueza do homem), O PASQUIM, os jornais dos partidos de esquerda (Tribuna Operária do PC do B) e uma publicação socialista Cadernos do Terceiro Mundo. Li também A Ilha (de Fernando Morais) assim como o Manifesto do Partido Comunista (Karl Marx). Lia isso às escondidas em casa, já que meu avô com quem eu morava, era um milico linha dura que serviu às ditaduras de Vargas e à ditadura de 64, pelo menos como seu entusiasta e simpatizante.

Em 1982, fui trabalhar como músico e diretor musical com um dramaturgo chamado Joacir de Castro, velho militante do Partido Comunista Brasileiro. Fora ele um dos militantes do extinto MCP (Movimento de Cultura Popular) que fora perseguido de desmontado pela ditadura militar. Era comunista aguerrido e sua dramaturgia era engajada, muitas vezes chegando a ser panfletária. Pelas suas mãos e dos professores do Centro de Educação da UFPE completei com as leituras da obra de Paulo Freire e Darcy Ribeiro minha adesão ao campo ideológico da esquerda.

Em 1985, morando fora de casa e trabalhando com um povo ligado ao PCB num grupo de teatro na Vila o IPSEP terminei virando militante do “partidão” durante cerca de um ano e meio, chegando a ser eleito secretário político da base da Vila do IPSEP. Amigos meus ligados os PC do B que viviam me chamando pro lado deles reagiram indignados com minha adesão a um partido revisionista de quem se declaravam inimigos, aliás como artista era cortejado e paparicado naqueles tempos pelas forças de esquerda. Esse ano de 1985 era ano de eleição e eu mergulhei fundo na campanha para prefeito de Roberto Freire que teve uma pífia votação de 3% dos votos, militei durante uma campanha eleitoral, não tive acesso ao processo de formação ideológica de quadros, na base do oba-oba da campanha.

Terminei dando razão aos colegas do PC do B, abandonando a militância no PCB, mas não aderi mais a nenhum partido de esquerda organizada. Não me adaptei às formas de relacionamento baseadas no “centralismo democrático”, a hierarquia partidária, o dízimo e a mesmice do pensar e do palavrório dos camaradas. Ser militante não era mesmo do meu feitio de ser e estar no mundo, mesmo assim permaneci fiel aos postulados de esquerda, passei a votar nos candidatos do PC do B a partir desses anos que se seguiram a 1986. Admirava sua coragem na luta armada na Guerrilha do Araguaia, além do fato do partido ser uma força monolítica, ao contrário do PT que desde a origem sempre foi uma miríade de tendências ideológicas, muitas vezes conflitantes e rivais entre si.

Vivi sete anos com uma militante da tendência stalinista que lutou no Araguaia, isso me fez conhecer de perto a militância e a cúpula comunista no Recife e Olinda, participar como voluntário em atos do partido, animando comitês eleitorais e festas para arrecadar fundos pras campanhas a deputado e vereador que se seguiram ao ano de 1990. Até 2000, permaneci simpatizante dos comunistas, testemunhei o desencanto com fim do sonho comunista com a queda do Muro de Berlim, assim como a verdadeira feição do último bastião comunista que lhes servia de paradigma: a Albânia, uma fraude social como tudo que ocorria no leste europeu, coisa que eles sempre negavam.

Em 2002 companheiros do PT ligados aos órgãos de cultura no Recife passaram a me convocar para trabalhos culturais. Fui num crescente sendo prestigiado para inúmeros projetos em música e cordel e nunca fui cooptado nem cobrado por eles para tomar parte em atividades eleitorais do partido. Os comunistas em 2004, somente na época de eleição, se lembraram da minha existência mandando suas correspondências convidando para inaugurar comitês, etc. Na lógica deles, a solidariedade deles é apenas com sua militância, as demais pessoas só existem nessas ocasiões, pelo menos em relação ao meu caso é assim, não falo pelas demais pessoas. Teve um deles que chegou a me perguntar desde quando eu me tornara “traidor do povo”, ao ver minha pessoa com um adesivo eleitoral do deputado Fernando Ferro. Eu disse : - desde quando Fernando Ferro que é aliado do seu partido em Brasília é uma traidor do povo? Um deputado dos mais combativos, inclusive na CPI do Narcotráfico? Nada me respondeu.

Em outra ocasião, em 2004, uma militante, candidata comunista a vereadora em Olinda me chamou pra tocar de graça no comitê dela. Eu disse que no mesmo dia e hora, uma sexta-feira,eu tocava num boteco e que se ela bancasse o cachê do bar eu animaria o comitê dela. Ela me perguntou desde quando eu me tornara mercenário. Eu estava em Olinda indo buscar meus filhos que moram com a mãe, que nesta hora se aproximavam de mim trazidos pela genitora deles. Eu apontei pros três que subiam a ladeira e disse: - Virei mercenário desde quando trepei duas vezes sem camisinha com aquela mulher ali e nasceram aqueles dois meninos.Esta moça ficou dialeticamente calada. Um terceiro deles me ameaçou recentemente com um paredão quando ri dos lamentos dele como o ocaso de Fidel Castro e que Cuba era o último sonho da Humanidade, eu ri mais ainda, pois o coitado é um alcoólatra decadente e não agüenta nem segurar um fuzil pra tomar o poder na luta armada e depois fuzilar a quem chamam de inimigos do povo no meio dos quais eu estou incluído agora. De pé ó vítimas da fome........ Trabalhar para a direita nunca fiz e nem pretendo fazer na vida, porém, trabalhar de graça para a esquerda como no tempo das vacas magras (deles é claro) nem pensar.

Nenhum comentário: