domingo, 23 de março de 2008

CARAVANA PÉ NA ESTRADA PELA EDUCAÇÃO



Embarquei esse mês de março de 2008 com os jovens estudantes universitários numa caravana chamada PÉ NA ESTRADA PELA EDUCAÇÃO. Uma iniciativa da UEP (União dos Estudantes de Pernambuco) com apoio da UNE e de órgãos oficiais ligados às ações junto à juventude. O tema da caravana, que teve ações em escolas da região metropolitana, foi um debate acerca do papel da universidade como elemento de alavancar o desenvolvimento local com inclusão social. De fato, Pernambuco prenuncia um novo surto de investimentos de vulto com a refinaria, estaleiro, Hemobrás , etc. No entanto, sem capacitar nosso povo para ocupar esses futuros postos de trabalho, teremos fatalmente algo similar ao que houve em Camaçari na Bahia, onde muitos desses postos foram preenchidos com mão de obra de outras regiões. Além disso, a reforma universitária, até hoje empacada no Congresso Nacional em função do forte "lobby" das escolas privadas de ensino superior. Compus um cordel glosando o mote: De que vale investimento / Sem povo capacitado, este faria parte de uma intervenção poética e musical que os jovens contrataram para que eu fizesse em 10 eventos que ocorreriam no Recife, Olinda e cidades do agreste. Aqui no Recife, tive o dissabor de ver uma escola privada de grande porte hostilizar esses jovens ativistas estudantis. Fomos obrigados a fazer nossa atividade política e cultural numa rua poeirenta no entorno dessa escola, já que proibiu a presença do movimento estudantil no âmbito de suas instalações. Uma coisa descabida e anacrônica em tempos de democracia formal em que vivemos.

Os jovens,todos ligados à esquerda organizada, majoritariamente ligados ao PC do B, bastante imbuídos como toda militância jovem, com sua linguagem padrão de chavões e palavras de ordem, bastante aguerridos e nas atividades tentando, muitas vezes de forma improvisada por em cena seu trabalho de divulgação de assunto de grande relevância e interesse social. A atividade era constituída de uma animação cultural feita com música e poesia para atrair o público. Em seguida, no auditório passavam um documentário que versava sob as temáticas a serem debatidas nas escolas. Primeiro um histórico de como se deu a criação das universidades no Brasil desde o império. O século vinte, a ditadura, os anos neoliberais de Collor e FHC nos quais o ensino superior privado cresceu 207% enquanto as escolas públicas de ensino superior apenas 50% em número de vagas. Depois disso, um depoimento de estudantes alienados e bobalhões de classe média acerca do seu conhecimento da reforma universitária. Uma coisa pavorosa a alienação e indiferença dessas pessoas,totalmente desconectadas das questões cruciais, dizendo um monte de asneiras, coisas como: " eu detesto política". Gente sem informação totalmente imbuída do espírito individualista do "vencer na vida", fora do sentido de luta social e coletiva, necessária como veículo de idéias e ações no sentido de pressionar os poderes com relação às responsabilidades que estes devem ter com os rumos da educação. Como contraponto, falas de líderes estudantis, na linguagem padrão das doutrinas de esquerda de inspiração marxista, formatação doutrinária característica, porém , coerentes e sérios em seus propósitos, esses pelo menos tem idéias na cabeça, se são originais ou fruto de doutrinação, o fato é que pelo menos têm uma posição coerente e fundamentada.

Na seqüência, a fala de dois reitores de universidade públicas, um primor de pensamento socialmente avançado e comprometido com a qualidade de ensino e responsabilidades socais que as escolas públicas devem ter com os demais segmentos sociais. Além desses, uma deputada do PT cuja ligação com os assuntos de educação faz do seu mandato uma forte voz de ressonância dos anseios mais legítimos de nossa juventude com relação ao seu acesso aos bens imateriais da educação e cultura. Pra fechar, o dono e reitor da escola privada que barrou meus parceiros no campus de sua empresa. O cidadão é favor da liberação dos limites acima dos 30% permitidos do capital estrangeiro nas escolas de ensino superior no Brasil. Além disso, o cidadão dizendo-se totalmente avesso a qualquer forma de controle social e comunitário com relação às atividades "empresariais" de ensino, afirmando que isso contradiz o princípio sagrado da "livre iniciativa" e as leis do "deus-mercado". Para fechar, vem com uma pérola que me deu vontade de vomitar, algo mais ou menos assim: -é privado, mas tem primar pela qualidade, no futuro, será como restaurante(palavras dele), o que for ruim vai fechar... Simplesmente nojento. Fecha o documentário com imagens de uma passeata dos estudantes no Recife nos moldes dos festivos caras pintadas que "derrubaram" Fernando Collor.

Em seguida uma série de falas dos membros da mesa: presidente da UEP, representante do DCE local, representante da UNE, representante da escola em questão, e autoridade municipal de educação. Na parte final o microfone aberto aos presentes ao debate. Isso aconteceu em Vitória de Santo Antão, Caruaru com acalorados debates, com gente discordante da afiliação partidária dos companheiros questionando a eficácia e validade desse alinhamento ideológico, fizeram sem sucesso, um desses, secretário municipal de sua cidade que ensaiou um palanque e só não foi vaiado porque os jovens do movimento demoveram a assistência dessa atitude desrespeitosa. Em Garanhuns, foi esvaziado em face do choque do calendário acadêmico da escola, assim como o fato de muitos estudantes serem da área rural do entorno e dependentes dos serviços de transporte disponibilizado pelas prefeituras de suas cidades.

Nas ocasiões declamei meu cordel na parte final do debate, distribuindo com os presentes cópias do cordel que foi bem recebido por onde passamos. Foi uma grande e gratificante experiência poder partilhar dessa caravana com meus bravos e bravas criaturas do movimento estudantil para o qual fui indicado pelo diretor do CUCA, órgão cultural da União Nacional do Estudantes-UNE. Aprendi muito com esse povo jovem que ousa manter o pé na estrada e incomodando dos donos do Brasil.


ALLAN SALES


I

Teremos refinaria

Grande parque industrial

Impacto ambiental

Pernambuco nesta via

Mas chegará nosso dia?

Desenvolver nosso estado?

O que vimos no passado

Faz gerar um pensamento

De que vale investimento

Sem povo capacitado

II

Aqui um pólo gesseiro

Um porto no litoral

Um avanço colossal

No Pernambuco guerreiro

Um esforço pioneiro

Que será implementado

Governador deputado

Senador neste fomento

De que vale investimento

Sem povo capacitado

III

A riqueza que se gera

Aumentando a produção

Se não traz educação

A coisa se degenera

Pra gerar a nova era

Só com o povo educado

Instruído e preparado

Pois é chegado o momento

De que vale investimento

Sem povo capacitado

IV

Levar pro interior

Educação e cultura

Forjar a era futura

Esforço de educador

O educar redentor

Não fazer em separado

Um Pernambuco integrado

O saber por instrumento

De que vale investimento

Sem povo capacitado

V

Juventude e opinião

Discutir como se faz

Como progresso se traz

Sem trazer a exclusão

Educar faz comunhão

Ver esse povo letrado

Consciente emancipado

Deve ser o nosso intento

De que vale investimento

Sem povo capacitado

VI

O futuro do Brasil

A juventude discute

O seu pensar repercute

Movimento estudantil

A UNE que produziu

A UEP ao seu lado

O movimento acertado

Pelo desenvolvimento

De que vale investimento

Sem povo capacitado

VII

Se o presente é de luta

O futuro nos pertence

Che Guevara nos convence

E isso ninguém refuta

Comungamos na permuta

Um pensamento avançado

O presente e o passado

O futuro a todo vento

De que vale investimento

Sem povo capacitado

VIII

Paulo Freire nos dizia

Da grande contradição

Educar por redenção

Nossa real alforria

O futuro se anuncia

O desafio é lançado

Aqui no verso o recado

A verdade é nosso alento

De que vale investimento

Sem povo capacitado

IX

Pernambuco libertário

Tem exemplos na história

O povo quer sua glória

Dignidade e salário

Meu Pernambuco operário

Que não vai ser enganado

Ver esse povo engajado

No futuro novo invento

De que vale investimento

Sem povo capacitado

X

E com o pé na estrada

A caravana que avança

A consciência se alcança

Na estudantil jornada

Vamos de alma elevada

Um movimento pensado

Ver esse povo acordado

Consciente e sempre atento

De que vale investimento

Sem povo capacitado.

Um comentário:

fotos de cordel disse...

MUITO BOM !!!!!
EU SOU SUSPEITA DE TI FAZER COMENTARIOS!!
SOU SUA ADMIRADORA!!
UM XERO!!!