quarta-feira, 6 de junho de 2012

Em respeito a Ogum Guerreiro.



O que mais me impressiona nas interpretações religiosas do mundo é quando a coisa descamba pro campo da intolerância, da negação da fé ou da não fé de alguém. Recentemente eu conversava com uma moça numa sala de papo de rede social. Ela me falava da sua intenção de fazer um convite de casamento utilizando a poesia de formas fixas do cordel como expressão, contando pras pessoas acerca do perfil dela e do noivo, assim como o casal se conheceu, se apaixonou e resolveu partir para o enlace.

Casal afro-descendente, ambos simpatizantes das religiões afro-brasileiras, razão pela qual ela, no nosso papo, deu referências acerca dos orixás que regiam ela e seu futuro marido. Eu comecei a escrever um singelo texto baseado nas histórias que ela me contava. Tenho especial carinho pelas religiões de matriz africana das quais tive grande aprendizado de vida, já que, embora tenha sido criado na religião espírita kardecista, eu conheci de perto os cultos de umbanda e candomblé.

Após ela ficar entusiasmada com as referências ao seu orixá e o orixá do seu noivo, de repente, ela me pede para deletar do texto essas referências. A razão era essa: não queria “chocar”, palavras dela, os parentes evangélicos do seu noivo. Eu fiquei pasmo, imagine se ela fosse judia, muçulmana ou budista? Haveria esse pudor todo? Eu disse a ela: - minha amiga os evangélicos no Brasil vivem chocando todo mundo com a intolerância de muitos deles com relação a um monte de coisas, mas não podem ser chocados.

Mesmo assim, a moça não quis assumir o seu lado místico de matriz afro no seu convite, uma pena, pois as referências que fiz a Iansã e Ogum no meu texto ficaram lindas demais, com toda beleza da mitologia do candomblé, uma crença milenar mais antiga que o cristianismo.



Eu sou travado demais com essa timidez e esse medo que umbandistas e gente do candomblé que aceitam passivamente os arroubos dos pretensos donos da verdade que lêem a bíblia da forma excludente, maniqueísta e intolerante, em especial muitos protestantes. Já tive muitos embates com esses fanáticos em muitos momentos em minha vida. Hoje não transijo com esse tipo de censura à expressão de culto que essa gente sectária e fanática faz com a maior naturalidade, muitos deles acalentam até idéia de criminalizar esses cultos.

Em respeito ao Pai Ogum Guerreiro e à Mãe Iansã, me demiti da tarefa de fazer o cordel convite dessa irmã de fé que não tem coragem de assumi-la diante desse tipo de gente estúpida e intolerante.



Ogum yê.



(1)
Muita gente que tem hipocrisia
Escondendo não deixa de fazer
O vizinho fofocas pra dizer
Faz intriga regada de ironia
Cada qual tem a sua fantasia
Escondida no fundo do roupeiro
No final se revela por inteiro
E pra que esconder religião
No Brasil tão católico e cristão
Muita gente tem fé em macumbeiro
(2)
Perseguiu tal fascismo getulista
Pais de santo e também os patuás
Sem poder cultuar os orixás
E seu culto tirar de ver à vista
Mas findou tal poder que foi fascista
Hoje em dia tem toque no terreiro
Tem ebó nas “encruza” o tempo inteiro
Iemanjá por aí faz um festão
No Brasil tão católico e cristão
Muita gente tem fé em macumbeiro
(3)
O sujeito na igreja vai rezar
E depois consultar a mãe de santo
O pastor muito irado causa espanto
Mas exu ele teima em expulsar
Na sua igreja o exu irá baixar
Para encher “sacolinha” deste obreiro
Pois o deus deste puto é o dinheiro
Pois é sócio de Jesus também do Cão
No Brasil tão católico e cristão
Muita gente tem fé em macumbeiro
(4)
Tem também a “sessão de descarrego”
É igreja ou terreiro de umbanda?
Pois exu baixa sempre nesta banda
E o pastor no seu bolso sem sossego
Dez por cento aleluia no seu rego
O pastor mas parece um feiticeiro
Na igreja abre louco seu berreiro
Pra Macedo ganhar mais de um milhão
No Brasil tão católico e cristão
Muita gente tem fé em macumbeiro

ALLAN KARDEC DO NASCIMENTO SALES

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